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Foi no já distante ano de 1997 que tirei a fotografia com que inicio esta publicação. O pequeno mas aconchegado cesto, as cores variadas refletidas pelo sol que inundava a marquise do nosso apartamento, captaram-me a atenção.
Esta imagem teve algum efeito de ressonância na minha mente e pus a mim mesmo perguntas para as quais procurei a resposta. Como seriam as molas de roupa noutros países? Que outros tipos de mecanismo e forma haveriam? Qual seria a “história” deste objeto tão comum?
Fui então aos poucos fazendo alguma pesquisa e criando uma pequena coleção.
Vou procurar de forma breve contextualizar o que fui descobrindo e mostrar alguns exemplos do que consegui colecionar.
Como terá surgido a ideia para este objeto?
Como tem sucedido na maioria das vezes na história do ser humano, a necessidade aguça-nos o engenho. Quando o Homem começou a lavar as suas roupas, por razões de higiene ou para as manter melhor conservadas, terá procurado formas de as secar ao sol.
Decerto que as roupas de pele, lã, linho, ou outros materiais seriam postas a secar sobre pedras, ou diretamente em ramos de árvore ou arbustos. Mas logo que começaram a fazer cordas feitas de fibras, vegetais ou animais, a ideia de as pendurar nesse suporte terá ocorrido naturalmente e daí a pensarem numa forma de evitar que tombassem com o vento.
Muito provavelmente terão logo nessa altura concebido mecanismos simples, ainda hoje utilizados. A forma mais básica passaria por abrir uma ranhura num pedaço estreito de madeira que tivesse alguma resistência.
Uma outra forma utilizaria um troço de ramo estreito de uma madeira flexível, como por exemplo o salgueiro. Nele é aberta uma fenda numa das extremidades e na outra é feito um laço de uma fibra, impedindo que se quebre.
Com a evolução das tecnologias, por exemplo quando os metais passaram a entrar nos usos quotidianos, durante o século 18 na europa, a sua maior durabilidade foi substituindo as fibras, permitindo que os modelos iniciais beneficiassem desta evolução. Surgiram assim molas como as da imagem seguinte, que ainda eram muito comuns no início do século 20.
Naturalmente com as progressivas evoluções tecnológicas, tornando comum a aplicação do aço, mas sobretudo dos plásticos, as formas e mecanismos foram evoluindo em muitas e diversas formas, tendo quase apenas a imaginação como limite…
A industrialização, modelos e patentes de molas de roupa
Com a industrialização, as sociedades mais desenvolvidas passaram a valorizar as novas ideias, pois uma boa ideia devidamente aplicada podia gerar imenso valor financeiro. Surgiram assim os conceitos de propriedade intelectual e patentes, para proteger os criadores dessas ideias de serem copiados de forma não autorizada. Os Estados Unidos da América (EUA) foram percursores neste campo.
A primeira patente conhecida para uma mola foi emitida precisamente nos EUA a 22 de março de 1832. Descrevia uma tira dobrada de madeira de nogueira, de seis polegadas, apertada com um parafuso de madeira. Mas quando foi fabricada, viu-se que não funcionava bem. A chuva e a humidade faziam o parafuso inchar e deixava de prender. Porém ficou para a história como primeira patente deste tipo de objeto. Note-se que na sequência de um incêndio no departamento de registos em 1836, perdeu-se esse documento, pelo que dele não existem cópias e não se conhece a sua imagem exata.
Passaram mais 21 anos para aparecer, em 1853, uma grande melhoria. O criador da patente chamou-lhe “spring-clamp for clotheslines”, que podemos traduzir por "grampo de mola para cordas de roupa". Chamava-se David M. Smith. Era natural de Springfield, no estado de Vermont, nos Estados Unidos da América. Tinha duas “pernas” em madeira, articuladas entre si por uma mola de metal.
Foi o antepassado moderno a partir do qual se criaram a maioria das molas que hoje temos. A imagem seguinte foi retirada do registo de patente e mostra qual o seu aspeto. Na minha coleção tenho uma mola muito semelhante que se poderá ver mais adiante.
A invenção de Smith foi revista e modificada vezes sem fim. Só até meados do século XIX houve mais 146 novas patentes nos Estados Unidos da América [1].
Uma evolução significativa a nível de materiais deveu-se ao italo-americano Mario Maccaferri, que desenvolveu o primeiro modelo de mola de plástico durante a Segunda Guerra Mundial, supostamente depois de se constatar a escassez de prendedores de madeira. Industrializou-a e a sua fábrica produziu mais de um milhão de unidades por dia para atender à procura em tempo de guerra [2] [3].
Esta imagem de molas em plástico, foram produzidas pela indústria criada por Mario Maccaferri. A que surge mais acima é o modelo inicial, ou seja, a primeira mola feita em plástico. Mostrarei adiante uma idêntica na minha coleção.
Naturalmente as variações de modelos, formas e mecanismos têm surgido sem cessar em ritmo cada vez maior.
Como último exemplo, relativamente recente, numa espécie de regresso às origens, veja-se o desenho das brasileiras Taciana Silva e Marcela Albuquerque, patenteado em 2006, que pode também ser visto adiante nas imagens da coleção.
Colecionar molas de roupa…
Porquê colecionar molas de roupa?
Resposta nº 1: Porque não?
Resposta nº 2: É fácil começar uma coleção. Todos nós temos exemplares para começar e possivelmente os nossos pais têm alguns, mais antigos, bem curiosos…
Resposta nº 3: É um objeto muito simples, sem pretensões, prático e condensa muitas ideias e aperfeiçoamentos do engenho humano.
Resposta nº 4: Considero que existe muita beleza nas rotinas simples da nossa vida diária. E fazendo minhas as palavras (adaptadas) de Lahey [2]… Considero bela uma corda de roupa a secar. É estimulante e conforta a alma, ver uma fileira de tecidos de cores e padrões variados erguendo-se com rajadas de vento, mantidos no lugar por minúsculos soldados de costas direitas, oscilando de um lado para o outro, firmes na sua missão, sobre as suas minúsculas dobradiças…
Devo dizer que por vezes me arrisco a passar por ladrão, ou quem sabe algo ainda mais censurável, quando, por exemplo ao passear numa qualquer rua, caminhando descontraído, a minha atenção é de forma instintiva atraída por um estendal, ficando o meu olhar automaticamente focado nas molas de roupa, procurando por modelos que ainda não tenha. E tanto faz que estejam a prender peúgas, calças, “lingerie” ou ceroulas…
Possivelmente há outros colecionadores em Portugal, mas até ao momento não identifiquei nenhum…
Consegui contactar alguns colecionadores estrangeiros, não muitos, mas foram todos muito simpáticos e temos trocado exemplares pelo correio. Todos tiveram comigo (e eu tentei retribuir) uma "atitude de mãos largas”. Doamos o que temos duplicado, se o outro colecionador não tem.
Penso que o maior colecionador de molas do mundo será Mike Bradley, engenheiro australiano reformado. Podem consultar o seu blog: https://peglomania.blogspot.com/
Faz poucas publicações, mas numa ele indica os links de acesso a fotografias da sua vastíssima coleção. Reproduzo os ponteiros no anexo desta minha publicação.
Alguns exemplares da minha coleção
Modelo de gancho simples – exemplares antigos e réplica recente em madeira
Modelo de gancho simples – exemplares antigos em arame / lâmina metálica
Modelo de gancho simples – em plástico ou metal
O modelo da direita mantém o desenho de Mario Maccaferri referido antes
Modelo de gancho simples - clipe
Modelo de gancho simples em espelho
O que surge à esquerda, corresponde ao desenho de Taciana Silva e Marcela Albuquerque referido antes
Modelo de gancho complexo – ação manual
Tensor triangular – tensão de contração em fio de aço
Tensor circular – tensão de contração em fio de aço
Tensor em fita – tensão de contração em aço
Tensor em fita – tensão de contração em plástico
Tensor em fita – tensão de expansão em metal / plástico
Tensor em hélice com asas – tensão de expansão
Tensor em hélice com asas – tensão de contração
Tensor em hélice simples – tensão de expansão
O modelo da esquerda é semelhante ao que referi atrás, panteado em 1853 por David M. Smith
Tensor em hélice simples – tensão de contração
Tensor em anel / fita de borracha – tensão de contração
Brincando com as formas…
E quando as crianças brincam…
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Por último, não por lhe atribuir menor significado, deixo o leitor na companhia de um poema que me foi dado a conhecer pela autora, Carla Veríssimo, que casualmente encontrou esta página e achou curiosas algumas correspondências entre as suas palavras e o conteúdo desta publicação.
Transcrevo apenas o seu início.
Como a autora o declama num vídeo original, convido o leitor (devia dizer "convídeo leitor"?) a escutá-lo...
Poema da mola da roupa - Ode Primeira
Apertam-me as pontas os teus dedos suaves.
Estalidos de prazer sob tensão se escutam.
No aro metálico que em espiral se embrulha, enrola, torce e retorce dentro do meu âmago.
Medula presa a pacotes de gente que vegeta, interpreta, desconecta.
...
Veja o vídeo neste ponteiro:
https://www.youtube.com/watch?v=Bc65N-4gWQ4
Se tiver curiosidade em conhecer mais trabalhos desta autora:
https://www.facebook.com/CarlaVerissimo.PaginaOficial
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Referências
[1] The Better clothespin (A melhor mola de roupa) https://www.inventionandtech.com/content/better-clothespin-0
[2] Lahey, Anita - Clothespin Encounters https://maisonneuve.org/article/2010/03/8/clothespin-encounters/
[3] Mario Maccaferri - un liutaio fra Cento, Parigi e New York - http://www.bagnoli1920.it/Sito_Tipo/Libri_files/cat_maccaferri-E.pdf
Anexo
Endereços de acesso à coleção de Mike Bradley
Butterfly Spring Pegs:
Compression Coil Sprung Clothes Pegs:
Conventional Design Pegs
Leaf Sprung Clothes Pegs:
Magnetic clip:
Ring Sprung Clothes Pegs:
Rubber Band Spring:
Self Sprung Plastic Clothes Pegs:
Self Sprung Wooden Pegs:
Tension Coil Sprung Clothes Pegs:
Wide Clip Sprung Clothes Pegs:
Wire over 6cm:
Wire under 6cm:
Wooden Conventional Pegs:
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